A desconsideração da personalidade jurídica é um conceito originário do sistema legal anglo-saxão, conhecido como “disregard doctrine”, cujo propósito é superar a autonomia e a separação patrimonial para responsabilizar sócios e/ou administradores por dívidas inicialmente pertencentes apenas à pessoa jurídica.
No ordenamento jurídico brasileiro, existem duas abordagens para a desconsideração da personalidade jurídica: (a) a Teoria Maior, prevista no Código Civil, artigo 50, e (b) a Teoria Menor, regulamentada pelo Código de Defesa do Consumidor, artigo 28, parágrafo 5º.
A Teoria Menor da desconsideração da personalidade jurídica (art. 28, § 5º, do CDC) requer apenas que o consumidor demonstre a insolvência do fornecedor ou que a personalidade jurídica seja um obstáculo para o ressarcimento dos danos causados. Isso decorre do princípio de que o risco inerente à atividade econômica deve ser suportado pelos integrantes do quadro societário, com poder de gestão, em vez do consumidor. Dessa forma, em casos envolvendo relações de consumo, a Teoria Menor permite a desconsideração da personalidade jurídica com base na insolvência do fornecedor, má administração da empresa ou na obstrução ao ressarcimento de danos aos consumidores (art. 28 do CDC).
No entanto, ao contrário da Teoria Maior estabelecida no Código Civil, o § 5º do artigo 28 do CDC não inclui uma disposição específica que permita a extensão da responsabilidade aos administradores não sócios, ou seja, àqueles que não fazem parte do quadro societário da empresa.
É importante observar que, na versão original do Código do Consumidor, havia menção explícita sobre a possibilidade de atingir o patrimônio dos administradores, mesmo que não fossem sócios, no § 1º do artigo 28. No entanto, essa disposição foi vetada, resultando na ausência de previsão na lei para a desconsideração em relação a administradores que não fazem parte do quadro societário.
Embora o caput do artigo 28 do CDC possa ser interpretado em conjunto com o artigo 50 do Código Civil para permitir a responsabilização dos administradores não sócios no contexto da Teoria Maior, essa interpretação não se aplica ao § 5º do artigo 28 do CDC, que estabelece critérios mais flexíveis para a desconsideração. Além disso, o § 5º se aplica a casos de mero inadimplemento, nos quais não se exige a comprovação de abuso da personalidade jurídica, prática de atos ilícitos ou infrações, mas apenas a falta de ativos pertencentes à pessoa jurídica para pagar a dívida.
Portanto, dada a especificidade do § 5º do artigo 28 do CDC e as implicações decorrentes de sua aplicação, é inviável adotar uma interpretação extensiva que permita a responsabilização de administradores não sócios no âmbito da Teoria Menor da desconsideração da personalidade jurídica. Essa limitação reforça a importância de analisar cuidadosamente cada caso e entender as nuances da legislação aplicável ao tratar de questões de responsabilidade de administradores não sócios em relações de consumo.